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sexta-feira, 17 de junho de 2011

CONCLUSÃO DO SEMINÁRIO FÉ E FILOSOFIA

Em nosso estudo, resultado de um curso de Fé e Filosofia, ministrado no SMAB, pretendemos mostrar, tendo como base o pensamento de alguns dos pensadores cristãos do período medieval, a relação e o processo de completude na questão entre Fé e filosofia. Nesse sentido, podemos afirmar que o exercício da atividade racional realiza-se, pois, com vistas à verdade religiosa, seja para demonstrá-la ou esclarecê-la nos limites em que isso é possível, seja como instrumento para defendê-la contra heresias e contra a incredulidade.

Assim podemos, pois, dizer que na Idade Média há filosofia e teologia, e ainda afirmarmos que uma coisa não é a outra, senão que entre ambas há uma relação de complementação. Na qual, esta relação entre fé e filosofia faz da filosofia uma serva, em outras palavras: philosophia ancilla theologiae. É dizer, a palavra “serva” não precisa significar simples subordinação. Realmente, a filosofia pode servir para a fundamentação e a formulação de conceitos teológicos, sem que, como filosofia, esteja subordinada a outro saber. A saber, a filosofia é chamada “serva” da teologia no sentido de se entender o dogma como princípio regulador da razão para evitar que essa se desvie da fé ou se volte contra ela.

Para melhor compreendermos esta questão da relação fé e filosofia, cabe-nos explicitarmos acerca da contribuição da filosofia para a teologia na Escolástica, isto é, desde que o cristianismo se impôs no Império Romano, a cultura teve que incorporar conceitos que mais pertencem à teologia que à filosofia. Ademais, ao natural surgiu o problema da relação entre esses dois níveis de conhecimento. Em geral pode dizer-se que a Escolástica é, em primeiro lugar, teologia, ou seja, a ciência que se ocupa em fundamentar, explicar e alicerçar o saber revelado, os dogmas aceitos pela Igreja. Ora, como sabemos, para tal fundamentação é necessário recorrer à filosofia. Além disso, alguns problemas e temas teológicos também são filosóficos. Dessa forma, fica claro que, a filosofia está presente na Escolástica, sendo difícil ocupar-se da filosofia sem entender à teologia, embora haja limites bastante precisos entre ambas.

Também na Escolástica cristã, observamos a tendência de querer levar o homem à compreensão da verdade revelada, através da atividade racional para tornar a verdade religiosa racionalmente acessível e esclarecê-la dentro dos limites possíveis, para poder defender a fé contra a incredulidade e contra heresias.

Contudo, a filosofia Escolástica reconhece, pois, um limite à razão: a doutrina revelada. E esta é, por bem dizer, a autoridade suprema. De modo que podemos já aqui entender a razão como dom natural do homem dado por Deus. Por isso quando o homem pensa é ele quem pensa e não Deus, diga-se de passagem também, que quando o homem crer é ele próprio quem acredita e não Deus que crer no homem, mais o homem que confia (crer) em Deus.

Com relação à compreensão da verdade revelada podemos entender que o dom está na revelação, isto é, o fato de Deus ter revelado o homem ao homem, e ter entrado na história. Assim, a fé abre o horizonte de uma realidade meta histórica que não pode ser conhecida pela razão pura e simplesmente, senão que pela revelação. A fé tem consigo o conteúdo da revelação. Aqui podemos dizer com São Tomás de Aquino que a fé pressupõe o conhecimento natural da mesma forma como a natureza pressupõe a graça (S. Th., I, q. 2, a 2 ad 1). Por isso a doutrina da fé, partindo de Deus, que se revela aos homens, é mais perfeita que qualquer outra ciência, pois parte de princípios mais elevados.

Em suma, o Aquinate entende a relação entre a graça e a natureza de maneira hierárquica, presumindo o conhecimento pela fé, o conhecimento natural como a perfeição pressupõe o capaz da perfeição. A teologia deve servir-se da razão humana: “A graça não destrói a natureza, mas a aperfeiçoa” (S. Th., I, q. 1 a. 8 ad 2).
A doutrina de Tomás de Aquino sobre as relações entre fé e razão pode resumir-se nas seguintes proposições:

1º) Fé e razão são modos diferentes de conhecer (S. Th. 1, q. 1, a 2).

2º) Fé e razão, filosofia e teologia, não se podem contradizer porque Deus é o autor comum de ambas.

3º) Embora a razão seja suficiente para conhecer as verdades fundamentais de ordem natural e seja autônoma no estudo das coisas naturais, é incapaz por si só, de penetrar os mistérios de Deus.

4º) Conclui-se que a razão pode prestar um grande serviço à fé, seja para demonstrar aquelas coisas que são preâmbulos da fé, seja para ilustrar, por meio de semelhanças e dissemelhanças, as coisas que pertencem à fé, ou ainda seja, enfim, para opor-se às coisas que são ditas contra a fé.