Artigos. (23)

terça-feira, 10 de maio de 2011

A RELAÇÃO DA FILOSOFIA ANALÍTICA COM A TEOLOGIA MORAL

É sabido que uma das formas, pelas quais, melhor compreendemos um tratado teológico ou filosófico, bem como, uma obra biográfica (e, outra qualquer), ou ainda, até mesmo uma disciplina é de suma importância termos claro o contexto histórico e cultural em que foram desenvolvidas. De igual modo notamos que tal fato, segundo o professor australiano, Kennedy, se faz presente na descrição da inter-relação entre a filosofia analítica e a teologia moral.

Não só é primordial termos claro o período cultural em que tal conteúdo se desenvolve, como também é crucial estarmos cônscios, das dificuldades encontradas. Tanto a filosofia analítica quanto a teologia moral, igualmente, tornam difícil a tarefa de descrever sua inter-relação, não só pelo seu contexto histórico, mas também pelos desafios encontrados no processo de aprimoramento, aceitação e consideração como fonte de renovação e contribuição de uma para com a outra, no caso; da filosofia analítica para com a teologia moral, pois, trata de uma serie de influências reciprocas, entre ambas as disciplinas, sem, contudo esquecermos a distinção entre filosofia anglo-saxã e filosofia Continental, isto é, houve uma diferença e uma independência muito grande entre filosofia analítica e teologia moral, a rigor, entre a filosofia considerada na Inglaterra como filosofia linguística e os teólogos moralistas. Decerto, atualmente podemos dizer que a filosofia analítica foi e é considerada uma fonte de renovação para a teologia moral, de modo não mais diferir com quão largas medidas uma disciplina da outra, dando se em contribuição mútua, e assim, possibilitando o reconhecimento da filosofia analítica como um parceiro de dialogo para a teologia moral.

Por exemplo, [...] Desde a Reforma, a teologia moral floresceu principalmente em países latinos e germânicos, onde predominava a perspectiva filosófica continental (OLIVEIRA, 2009. p. 119), assim, nestes países atualmente a renovação da teologia moral deu-se, sobretudo a partir do dialogo com correntes filosóficas, entre elas; a fenomenologia, o existencialismo e o personalismo, de modo que esta última (o personalismo) é considerada uma segunda tendência no pensamento anglo-saxão e apresenta em seu traço mais geral a insistência na realidade e no valor da pessoa e sua tentativa de interpretar a realidade. Ao passo que a filosofia analítica, é comumente entendida como uma filosofia tipicamente anglo-saxão, o que a torna diferente e oposta, por assim dizer, à tradição continental, á teologia moral.

Podemos entender o proposito principal da filosofia analítica, como sendo, de todo terapêutico, isto é, tem como meta curar nossos pensamentos, expressos na lógica e na linguagem, dos erros que normalmente nos afligem. Também podemos compreender segundo Kennedy, que um encontro com este tipo de análise lógico-filosófico é frequentemente uma experiência purificadora, que por sua vez manifesta e faz evaporar os erros de nossos pressupostos categoriais e de nossas premissas básicas. Nesta questão e com relação à filosofia Inglesa, propriamente, na Inglaterra acabou predominando a crença de que a maioria dos problemas filosóficos e até mesmo os enunciados ou statements não tem sentido e decorrem simplesmente das imperfeições da linguagem, motivo pelo qual se deve proceder a uma clarificação das questões mediante a, “analise linguística”, e essa clarificação foi feita pela filosofia, porém o pensamento inglês atual, sobretudo em Oxford, afirma que a filosofia se reduz somente a isso.

Oliveira faz eco às palavras de Kennedy, quando retrata acerca da questão da relação e/ou, parceiro de dialogo e ao mesmo tempo da separação entre as duas tradições de pensamento, anglo saxão e continental, que por sua vez, podem ser “simbolizados pelas trinta milhas de mar que dividem a Inglaterra do continente europeu. Contudo o autor destaca que a filosofia analítica, até há pouco tempo não era considerada uma fonte de renovação para a teologia moral, senão que a situação de vez em vez fora mudando com a entrada da Grã-Bretanha na união europeia. Decerto que hoje a filosofia analítica tronara-se um prato muito requisitado no menu intelectual europeu. Isso possibilitou o reconhecimento da filosofia analítica como um parceiro de dialogo para a teologia moral. Podemos notar que entre as dificuldades encontradas na relação entre a filosofia analítica e a teologia moral, a maior é aquela a qual em sua relação tardou o desenvolvimento entre ambas as disciplinas, a saber, por causa do problema da condição dos católicos na Inglaterra, pois, estes estavam passando por um período de perseguição, terminando somente com a emancipação católica por volta de 1829.

O encontro entre ambas às disciplinas pode ser descrito em quatro fases, nas quais temos;

1º Um ponto de inflexão na história da filosofia; Deu-se, sobretudo por meio de leigos, convertidos à fé católica, que viam sua vocação na pesquisa filosófica dentro de universidades inglesas e através de suas obras adentraram a filosofia analítica no pensamento católico. Segundo Kennedy, as pessoas que tiveram um papel fundamental nesta ruptura foram Peter Geach e Elizabeth Anscombe, que estavam em contato direto com os principais filósofos, particularmente com L. Wittgenstein. Eles eram conhecedores extremamente competentes tanto da tradição aristotélico-tomista quanto das tecnicidades da analise lógica, fazendo assim a ponte entre a filosofia analítica e a teologia moral. O Cardeal Cahal B. Daly relembrou, no encontro anual em Spode House, como eles se esforçaram para encontrar razões sólidas para suas crenças, demonstraram que existe um modo católico de fazer filosofia, que é inteiramente compatível com as leis da razão, com as normas da filosofia e com as exigências de rigor da lógica e que é, de forma descompromissada, leal ás teses da revelação divina e aos ensinamentos da Igreja Católica. Elizabeth e Peter demonstraram, em suma, que a ortodoxia católica tanto é filosoficamente respeitável quanto é parte fundamental do humanismo europeu integral.

2º A guerra cultural entre a filosofia analítica e a teologia moral; Foi Erich D’Arcy, membro do circulo em torno de Elizabeth e Peter, quem levou a análise filosófica em confronto direto com a teologia moral, o mesmo viera depois a tornar-se arcebispo de Hobart. Ele reconheceu, segundo nos diz Kennedy, que os primeiros princípios da lei natural tais como expostos por Santo Tomás não poderiam atuar como a premissa maior de um silogismo. Depois concluiu que estes princípios emergem da reflexão sobre a experiência, mas acrescenta que a relação logica entre eles e as normas individuais não foi suficientemente explicitada pela tradição. D’Arcy tornou claro também o profundo senso crítico da filosofia analítica em relação a algumas linhas principais da renovação da teologia moral experimentada após o Vaticano II. “A renovação da teologia moral ocorreu principalmente nos termos predominantes na filosofia de origem franco-germânica, tais como as correntes de pensamento que derivam de Kant, Hegel e Kierkegaard até a fenomenologia, o existencialismo e depois o estruturalismo” (OLIVEIRA, 2009. p. 124).

3º Tentativas de aproximação e assimilação; Este é o período em que o conhecimento da filosofia analítica tornou-se difundido entre os teólogos moralistas. O efeito dessa nova mentalidade pode ser percebido na construção de teorias entre as duas esferas (filosofia analítica e teologia moral) de saber e, também no conhecimento das objeções que existem de parte a parte. Mais adiante, as considerações feitas por Alasdair MacIntyre contribuíram para que os teólogos moralistas descobrissem que a contribuição cientifica da filosofia analítica reestruturaria sua disciplina. Segundo Kennedy, Bruno Schülher, foi quem introduziu a terminologia analítica na formação geral dos teólogos moralistas a nível mundial. Ele retomou a distinção de C. D. Broad, entre ética deontológica e ética teleológica¹ e aplicou-a aos modos de tratamento da questão nos manuais de teologia moral. Scülher afirmava que na casuística alguém descobre que uma norma tida como absoluta, que não permite nenhuma exceção, apresenta de fato exceções quando aplicada em determinadas situações ou quando determinadas situações consequências se tornam evidentes (OLIVEIRA, 2009. p. 127), a disjunção entre deontologia-teleologia estabeleceu o ponto essencial de referência para o debate sobre a fundamentação e justificação de normas morais.

Por fim a (4º) quarta fase; A emergência da doutrina do realismo moral como desafio atual para a teologia moral; Não há dúvidas de que a filosofia analítica provocou uma revitalização vigorosa nas discussões sobre o método e a forma da teologia moral no mundo anglo-saxão, pode se dizer que a evolução da filosofia analítica determinou novas perspectivas no desenvolvimento atual da teologia moral.

Enfim, o autor, Kennedy, buscou explicitar neste artigo a relação entre a filosofia analítica e a teologia moral, insistiu em deixar clara a questão da inflexão e da tentativa de aproximação entre ambas às disciplinas. Apresentou também ainda que sinteticamente, algumas das dificuldades que tais disciplinas encontraram ao se tornarem parceiras.

Estudo referente à obra: KENNEDY, Terence. A relação da filosofia analítica com a teologia moral. In: OLIVEIRA, Manfredo (org). Correntes Fundamentais da Ética Contemporânea. 4º ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário